Por Abilio Machado
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Quando a Decepção na Comunidade Religiosa se Torna um Ciclo: Como Romper com o Sentimento de Abandono,
Ao longo da vida, muitos de nós buscamos em comunidades religiosas um espaço de acolhimento, um lugar onde nos sentimos cuidados e valorizados. Afinal, essas instituições sempre pregam que "devemos cuidar uns dos outros", "acolher a ovelha perdida", "estar lá para quem sofre". No entanto, a realidade nem sempre corresponde às palavras. Em certos momentos, especialmente nos mais difíceis, como doenças ou crises pessoais, o apoio esperado parece inexistir. E, quando essa falta de atenção se repete, surge uma dor que nos leva a questionar: por que essa decepção parece um ciclo?
Lembro-me da minha própria experiência. Participei ativamente de uma instituição religiosa por cinco anos, realmente vivenciais a instituição, a conheci, eventos, palestras, missas, campanhas, presidi movimento de jovens, dedicando meu tempo e energia, acreditando estar entre irmãos. Mas, então, ao enfrentar um infarto e uma cirurgia de revascularização, fui surpreendido pelo silêncio absoluto da comunidade. Nenhuma ligação, nenhuma visita, nenhuma palavra de apoio.
E hoje, com outras decepções no período, então me encontro em outra instituição, e creiam, a história se repetiu: adoeci e passei quase cinquenta dias sem poder comparecer, mas só a pouco, agorinha, recebi um contato para saber como estou. Ontem confabulei com minhas filhas sobre isso, já com a ideia de escrever este artigo desabafo, pois neste tempo recebi visitas de membros de outras instituições, diferentes de tudo, recebi visita de evangélicos, de espírita e até ateu, que vieram saber como eu estava. É uma sensação amarga de exclusão, quase como um ciclo que se torna difícil de quebrar.
A Profundidade da Frustração: Expectativas e Ciclos que se Repetem
Do ponto de vista psicológico, essa decepção toca em nossas expectativas mais profundas. Quando nos entregamos a uma comunidade, investimos não apenas nosso tempo, mas nossa confiança, acreditando que, no momento certo, seremos acolhidos. Quando isso não acontece, sentimos como se nossas necessidades emocionais fossem invisíveis. Essa sensação de abandono pode até mesmo trazer à tona dores de experiências passadas, nos fazendo pensar se estamos, inconscientemente, repetindo um padrão de exclusão ou abandono, algo que herdamos de nossa própria história familiar.
Segundo a Constelação Familiar Sistêmica, às vezes, carregamos “lealdades invisíveis”, ciclos emocionais que vêm de gerações anteriores, onde talvez a dor da exclusão ou da invisibilidade já estivesse presente. Sem perceber, podemos buscar contextos ou relações que recriam esse mesmo cenário, como se, inconscientemente, tentássemos entender ou resolver uma dor antiga.
Quando a Comunidade Fica Aquém das Expectativas
O desapontamento com a comunidade religiosa também nos leva a refletir sobre o que esperamos dela. Afinal, ouvimos pregações sobre o “cuidado com as ovelhas”, sobre a missão de acolher os que sofrem. Naturalmente, nossa mente e coração criam uma expectativa de reciprocidade. Mas a verdade é que, muitas vezes, essa reciprocidade não acontece. Não porque somos menos importantes, mas talvez porque as pessoas também estão presas em suas próprias limitações e falhas.
Nesse ponto, pode ser útil olhar para nossa fé de uma forma mais direta e pessoal. Em vez de depositar toda a esperança nas pessoas, podemos focar em fortalecer nossa conexão espiritual, buscando apoio no divino, sem depender tanto da resposta humana. Em várias tradições religiosas, essa falta de suporte é até vista como um convite para fortalecer a fé e encontrar consolo diretamente em Deus.
A Visão Estoica: Aceitando o que Não Podemos Controlar
A filosofia estoica, por outro lado, nos oferece um caminho de serenidade em meio às frustrações. Os estoicos ensinam que não temos controle sobre o comportamento dos outros, mas podemos controlar nossa reação a isso. Quando nos deparamos com o silêncio de uma comunidade que julgávamos acolhedora, podemos refletir: “Isso está sob meu controle?” Se a resposta for não, o melhor é focar no que podemos mudar – nossa postura, nossa paz interior. Essa prática de aceitar o que não depende de nós pode ser libertadora, evitando que carreguemos a decepção e o ressentimento.
Um Caminho Prático para Transformar a Frustração em Paz
Esses conceitos podem parecer teóricos, mas aplicá-los no dia a dia pode fazer uma grande diferença. Aqui estão alguns passos práticos para lidar com esse sentimento de decepção:
1. Revisar Expectativas: Pergunte a si mesmo o que realmente espera da sua comunidade. Muitas vezes, percebemos que colocamos muita responsabilidade sobre as pessoas, quando essa necessidade de acolhimento talvez pudesse ser suprida de outras formas.
2. Fortalecer a Fé Direta: Dedique momentos à oração ou meditação, buscando apoio na sua espiritualidade. Essa prática pode trazer consolo e preencher a ausência que sentimos em momentos de abandono.
3. Focar no Controle Interno: Quando a frustração bater, lembre-se de que você não controla as ações dos outros, mas pode escolher como reagir a elas. Cultivar essa paz interna é um dos maiores ensinamentos do estoicismo e ajuda a evitar que o ressentimento tome conta.
4. Diário Pessoal: Manter um registro das situações que o frustram pode ser muito útil. Ao final do dia, anote aquilo que o magoou e reflita: “Eu poderia ter mudado essa situação ou não?” Isso ajuda a processar a experiência de maneira mais leve, e, com o tempo, você começa a perceber que nem tudo merece tanto peso.
Encontrando um Novo Sentido na Jornada
Por fim, aceitar que as falhas das pessoas fazem parte da vida e que, mesmo diante das decepções, nossa fé pode ser nossa fonte mais segura de apoio, nos permite caminhar com mais leveza. Pode ser que a comunidade nem sempre corresponda às nossas expectativas, mas, ao cultivar nossa paz interior e uma fé mais direta, encontramos força para seguir em frente sem carregar a dor da decepção.
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Superar essa frustração é um processo que leva tempo. Reconhecer e expressar esses sentimentos, como você fez, já é um grande passo.
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Sempre que precisar desabafar ou buscar uma nova perspectiva, estou aqui para ajudar. Sou Abilio Machado, Psicoterapeuta, Neuropsicopedagogo ICH e Arteeducador Cênicoe Plástico.
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