Por que as pessoas boas sofrem?
Por Abilio Machado
Lá estava eu, parado no trânsito de uma segunda-feira, com aquele calor abafado dentro da Van da saúde, conduzida pelo Schpiura, e a fila de carros que parecia não ter fim. No rádio, no celular, alguém perguntava: "Por que as pessoas boas sofrem?" Eu ri meio amargo. Era a pergunta que todo mundo já se fez ao menos uma vez na vida. E, sinceramente, talvez a única que nunca vai ter uma resposta exata.
Pensei na dona Maria, a vizinha que cria gatos de rua e distribui bolos para as crianças do bairro. Outro dia, vi os olhos dela marejados porque roubaram a bicicleta velha que usava para ir à igreja. E o Seu João, que sempre ajudava todo mundo na oficina, mas acabou falindo porque confiou demais em quem não devia. Por que o universo parece tão injusto às vezes?
Mas, olha, enquanto a van avançava lentamente, percebi algo. As pessoas boas, aquelas que realmente carregam a bondade no peito, não sofrem porque fizeram algo de errado ou porque o mundo está conspirando contra elas. Elas sofrem porque sentem. Sentem de um jeito tão profundo que carregam os pesos que outros ignoram. Sofrem porque enxergam a dor que muitos preferem virar o rosto.
Ser bom é como ser um campo de flores: bonito, mas vulnerável ao vento, à chuva forte, ao pisoteio. A bondade não é uma armadura; é uma janela aberta para o mundo. E é exatamente isso que torna as pessoas boas especiais. Mesmo diante do sofrimento, elas continuam florescendo.
A dona Maria, mesmo sem a bicicleta, ainda alimenta os gatos. O Seu João, depois de fechar a oficina, começou a consertar brinquedos para doar às crianças carentes. As pessoas boas sofrem, sim, mas, de algum jeito mágico e inexplicável, transformam a dor em algo maior.
No fim, talvez a questão não seja por que elas sofrem, mas o que fazem com isso. Porque a bondade não é sobre evitar a dor; é sobre não deixar que ela endureça o coração. É sobre continuar enxergando o outro, mesmo quando a vida nos dá motivos para desviar o olhar.
Então, da próxima vez que a pergunta surgir, tente olhar com mais calma. As pessoas boas sofrem porque têm coragem de ser vulneráveis. E, no fundo, são elas que fazem a diferença no mundo, mesmo quando ninguém está olhando.
O trânsito começou a fluir. Eu desliguei o celular para economizar bateria, assim fiquei sem o rádio, apenas curtindo o passar vagaroso da beirada da BR277 num borrão, mas fiquei com a certeza de que, apesar de tudo, vale a pena ser do time das flores, mesmo que o vento insista em nos sacudir de vez em quando.
Sejamos mais humanos em bobdade e caridade e menos críticos sem causa.
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