Um dia, em pleno outono, o vento uivou através da floresta como um lamento antigo. As nuvens cerraram os céus, e as folhas, em espiral frenética, pareciam sussurrar segredos esquecidos. No meio da tempestade, um corvo cruzava os campos, desafiando os ventos. Mas a natureza, impiedosa, lançou-o contra o galho seco de uma árvore antiga. Com um grito abafado, ele caiu. Sua asa — antes soberana — pendia quebrada.
Tentou levantar-se. Tentou abrir as asas. Mas a dor foi mais forte. A dor… e a solidão.
Elevou os olhos ao céu, onde os pássaros voavam indiferentes, e clamou com a voz quebrada:
— Socorro… eu não posso voar…
Uma pega, elegante e altiva, passou sobre ele. Viu, reconheceu… e zombou:
— Você, que sempre voou acima de todos nós, agora rasteja. Então, voa com o seu orgulho!
Atrás dela, outros vieram — o gaio, o pássaro dourado, o negro como noite. Nenhum parou. Nenhum estendeu uma asa. Apenas lançaram olhares gelados, como se a queda do corvo fosse merecida.
O corvo abaixou a cabeça. Ferido. Faminto. Esquecido. E a fé, aos poucos, escorria de dentro dele como sangue de uma ferida aberta.
Mas então… do silêncio entre os arbustos, uma voz pequena se ergueu:
— Eu posso te ajudar… se não temeres a minha fraqueza.
Era um pardal. Tímido. Cinzento. Invisível aos olhos da vaidade alheia. Saltitou até o corvo e, com esforço, deixou cair uma migalha de pão seco ao seu lado. Depois, trouxe uma gota d’água. Algumas folhas. Um abrigo improvisado.
— Por que estás a fazer isso…? — perguntou o corvo, incrédulo.
— Porque tu estás vivo. E porque, se eu caísse… eu também gostaria que alguém parasse por mim.
Os dias passaram. O corvo não podia voar, nem se mover. Mas o pardal não partiu. Partilhou com ele cada migalha. Contou histórias para afastar o frio. E fez do seu pequeno corpo uma chama que aquecia durante a noite.
E, quando a asa do corvo enfim se abriu, o primeiro pensamento não foi sobre os céus… mas sobre aquele pequeno ser que, sem nada exigir, lhe ofereceu tudo.
A primavera chegou. E com ela, a esperança.
Mas numa manhã, enquanto o pardal recolhia sementes, um falcão surgiu das sombras. Rápido. Letal.
Não houve tempo para nada.
Exceto… para um rugido de asas negras rasgando o céu.
O corvo, agora forte, desceu como uma tempestade viva. Abriu as asas com violência e, num golpe só, expulsou o predador.
O pardal, trêmulo, murmurou:
— Salvaste-me…
O corvo pousou ao seu lado, olhou nos olhos dele, e respondeu:
— Foste tu quem me salvou primeiro. Hoje, entendo que o valor não está no tamanho das asas… mas na grandeza do coração.
Moral:
Jamais subestime os pequenos. Às vezes, é neles que habita a coragem mais pura. A bondade que ofereces sem esperar retorno… um dia volta. E sempre no momento em que mais precisas.
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