quarta-feira, 21 de maio de 2025

Diversidade Cultural X Diversidade de Gênero

Por Abilio Machado, continuando a postagem anterior...

Me perguntaram no WhatsApp, agorinha:

_ Prof. Muito bom o texto, por que ainda se confunde diversidade cultural com diversidade sexual ou de gênero?

Eu respondi:

_ Porque a turma anda preguiçosa de raciocinar, Pedro ( nome fictício do Pedro hahahahaha ). Misturam tudo num grande feijão tropeiro identitário e, no fim, não sabem o que é carne seca e o que é farinha. A palavra “diversidade” virou um guarda-chuva que cobre tudo o que é “diferente do padrão” — e como o padrão é sempre branco, hétero, cristão e de classe média, qualquer variação entra no mesmo balaio.

A confusão começa porque tanto a diversidade cultural quanto a de gênero/sexual estão no mesmo campo de batalha: o do direito de existir. Só que são frentes de luta distintas. Cultura trata de tradições, línguas, modos de vida — o jeito como um povo dança, come, reza, vive. Já gênero e sexualidade têm a ver com identidade, corpo, desejo, papel social. Não é porque o pajé é gay que isso vira um combo automático.

Só que, num mundo que quer tudo mastigado e com legenda em tempo real, a galera bate o olho e pensa: “diversidade é coisa de minoria”, e pronto. Jogam um arco-íris em cima, colocam uma drag dançando maracatu no comercial, e acham que mataram dois coelhos com uma pedrada só. Representatividade? Check. Cultura? Check. Profundidade? Nenhuma.

E a mídia ajuda, né? Fica enfiando todo mundo no mesmo desfile, como se uma lésbica periférica e um mestre griô estivessem lutando exatamente pelo mesmo reconhecimento — quando, na real, cada um carrega feridas diferentes, histórias diferentes, e o mesmo sistema escroto que tenta calar todo mundo com o mesmo silêncio,  e eles mesmo em sua minoria tentam fazer outros minorias, pois tanto na diversidade cultural quanto a diversidade de gênero costumam bater no peito eu preciso de atenção aqui na favela por causa da minha melanina mesmo que o seu vizinho ande descalço, ramelento e que mal tem uma refeição ao dia, que divide o pão seco na fila do sus, mesmo tendo olho verde ou azul e o cabelo de milho queimado, mas o que importa é o eu, o outro é branco, foda-se se é pobre.

Então se confunde porque convém. Misturar dá menos trabalho do que entender. E enquanto isso, seguimos com a ignorância desfilando, de salto alto, achando que tá arrasando na passarela ou na vã fantasia de "estou protagonista na propaganda ou na novela das 09", aí  falar mal do coleguinha, achando que isso é inclusão.



E como você disse que buscou isso no Google e só lhe apareceu imagens com a bandeira da outra diversidade. E isso é a iconografia preguiçosa do marketing identitário. Hoje em dia, quando se fala em “diversidade”, os bancos, as ONGs, as agências de publicidade e até os órgãos públicos seguem um manual de cinco figurinhas repetidas: bandeira LGBTQIAP+, mulher negra sorrindo de turbante, casal interracial segurando criança, casal de duas mulheres de mãos dadas ou demonstrando família, casal de homens se beijando, vem roda de capoeira e, de bônus, um indígena em pose de livro didático. E pronto — tá feita a salada visual da "diversidade".

É sempre África ou arco-íris. Como se o mundo cultural inteiro coubesse nessas duas referências, como se diversidade fosse figurinha temática e não um espectro absurdamente amplo. Cadê o asiático brasileiro comendo pastel de feira? Cadê o imigrante sírio vendendo esfiha no interior de Minas? O caboclo do norte do Paraná, descendente de polonês e ucraniano, misturando chimarrão com pamonha? O ribeirinho do Amazonas que reza terço e cultiva lendas indígenas? Diversidade não é desfile do orgulho nem vitrine de etnia exótica — é o caldo confuso da vida real.

Mas sabe por quê essa redução acontece? Porque o que não é óbvio dá trabalho de explicar. Cultura japonesa no Brasil? Demanda contexto. Descendência alemã no Sul? Ih, cuidado pra não parecer nazista. Cultura nordestina? Melhor evitar, senão alguém vai dizer que é estereótipo. Então eles escolhem o que é mais fácil de sinalizar, o que já tem selo socialmente aprovado. LGBTQIA+ e África são os ícones-padrão da "diversidade palatável", aquela que dá like e não incomoda demais.

E é aí que a diversidade vira farsa. Porque ao invés de celebrar a complexidade do Brasil — esse país que tem mais mistura do que coquetel de bar universitário —, ela vira catálogo de estampa. Uma vitrine com meia dúzia de molduras, sempre as mesmas. Como se o resto da cultura brasileira estivesse em promoção no fundo da loja, empoeirado, fora de moda.

Mas não se engane, Pedrão: o problema não é a visibilidade das bandeiras ou das raízes africanas — é o monopólio da imagem. A pluralidade virou produto, e só se vende o que dá pra rotular rápido. O resto? Ah, o resto é só ruído. E ninguém quer ouvir ruído quando o post precisa caber em 240 caracteres, aí vai se explicar como, e como dia a velha frase sobre comunicação: o erro é achar que só ruído gera conquistas e não,  não faz mudanças,  o ruído não promove um bom diálogo e nem comunicação.







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