sexta-feira, 23 de maio de 2025

Só Estou Olhando, Moço!

 




Só estou olhando, moço!


— Filho, não vim comprar nada. Só gosto de olhar. A aposentadoria é pequena, mas estar aqui me faz bem, — disse a senhora com um sorriso tímido no mercado.


O mercado fervilhava de vida. Era uma manhã quente de julho e os corredores entre as bancas estavam cheios. Pessoas riam, pechinchavam, levavam sacos cheios de pêssegos, tomates e hortaliças.


Lucas, um homem na casa dos trinta, barba feita e olhos cansados, estava ali como de costume. Ele não gostava de supermercados — tudo parecia sem alma. Ali no mercado, tudo era verdadeiro. Pepinos com espinhos, tomates com cheiro de sol e vozes que lembravam infância.


Ao escolher frutas, viu uma senhora parada. Pequena, frágil, vestida de escuro, bolsa gasta e cabelo branco preso. Não comprava. Só olhava.


Ia seguir em frente, mas aquele olhar o fez parar. Ela segurou um tomate, cheirou, suspirou e o devolveu.


— Está procurando algo, senhora?


— Não, filho. Só estou olhando. Aqui tudo me lembra o tempo em que a vida tinha mais sabor.


Ele olhou para sua bolsa vazia.


— E o que a senhora mais gosta de comer?


— Tomates bem doces. E pepinos com espinhos — como os da minha infância.


Ele se virou para o vendedor:


— Um quilo de tomates, pepinos, abobrinhas, batatas, cenouras, cebolas. E um pouco de salsa e endro.


Ela tentou recusar. Ele apenas disse:


— É seu. Porque isso não devia ser assim.


Ela pegou os sacos com cuidado. Chorou.


— Obrigada, filho. Você é bom. Há poucos como você.


— Talvez não poucos. Só discretos.


A partir daí, se encontravam às terças e sábados. Olhavam, ele comprava, depois sentavam-se perto da fonte e tomavam chá. Ela — Dona Júlia Almeida — contava histórias da guerra, do primeiro rádio, da horta do avô.


Um dia, ela disse:


— Tenho um neto. Mora longe. Liga pouco. Mas você... você aquece o coração.


Lucas segurou sua mão.


Um dia ela não apareceu. Ele descobriu que estava no hospital. Coração.


Ele foi. Ela o reconheceu com um brilho nos olhos:


— Eu sabia que você viria.


Ele voltou todos os dias. Lia para ela. Mostrava fotos do mercado.


Depois de uma semana, ela partiu.


Um mês depois, Lucas voltou ao mercado. Colocou uma plaquinha ao lado dos tomates:


"Olhar não custa nada. Em memória de Dona Júlia Almeida, que via milagres nos tomates."


Desde então, ele ajuda outros. Compra, ouve, apoia. E outros começaram a fazer o mesmo.


Tudo começou com uma mulher que só queria olhar.

E isso foi suficiente para fazer nascer algo verdadeiro.


#papainoelcontadordehistorias

Nenhum comentário:

Postar um comentário